Sunday, September 05, 2010

Alternando-se

Corre pouco sangue em minhas veias, agora. 
Sinto que a vida não percorre todo o meu corpo em todos os momentos.  Está em meu coração quando amo e em minha garganta quando choro e sinto doer; repousa em meus olhos durante o sono, converte-se em sonhos nas noites frias e em pesadelos nas madrugadas quentes; desce pelos meus cabelos sempre que a brisa os toca e estampa-se em minha face quando chove e ergo a cabeça, braços abertos e mãos espalmadas a receber as bênçãos que caem com os pingos d’água.
Agora, a vida concentra-se em minhas mãos, donde sai, vez ou outra, para visitar meu ventre em busca de sua essência original.  Mas nunca me preenche, nunca me toma por inteiro.  Raciona-se, escolhe uma moradia a cada novo movimento que faço, a cada novo pensamento que produzo, alternando-se, migrando, deixando-se ficar apenas o preciso instante em que cada parte de mim carece dela imprescindivelmente.
Já me acostumei com isso.  Respiro pela metade, vivo em partes, construindo a imagem do todo com os fragmentos de lembranças deixadas pela sensação boa do calor que dessas pequenas porções é exalado.
Não imploro, não reclamo, não me entristece o fato de não ter a totalidade da vida em meu ser, como é forçoso pensar, pelo absurdo desenho que se forma em minha mente, quando a busco e imagino-me mapa estendido sobre uma mesa.
Eu apenas deixo-me ficar imóvel por alguns instantes, para poder sentir quando ela vai acontecer em meu peito, porque gosto de ouvir os sutis diálogos que acontecem entre o amor que a vida transporta em si e todos os amores que carrego em meu coração.




EmmyLibra
Jun 27, 2004 – 3:40pm

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