Monday, February 04, 2019

Uma carta para Vitor*

É, Vitor, eu acho
Que as coisas deram errado!

Sabe aquela planta sagrada
Que você plantou no jardim?
Os frutos não foram bem aqueles
Que você tanto sonhou.

O solo estava doente
Nele havia larvas-gente
Que infestaram sua lavoura!

Queria saber o gosto
Daquele fruto esperado?
Eu vou lhe dizer
O gosto que ele tem:

Tem gosto de chumbo,
Tem gosto de bala perdida,
Tem gosto de sangue escorrendo
E de soro 
Em corredor de hospital superlotado.

Tem gosto de miséria aquele fruto!
Tem gosto de passar fome,
Tem gosto de indignidade,
De esmola que faz eleição.

Tem sabor tão amargo, Vitor!

Tem sabor de morte, o fruto
Que você plantou.
De morte que se morre aos poucos,
Como aquela severina,
Da qual falava o poeta.

Ah! Vitor! Como aquele sonho
Parecia bonito de sonhar!
Como aquela lavoura, por um breve instante,
Encheu de verde o nosso olhar!

Mas depois, ou daltônicos viramos
Ou era nosso sangue que tingia
As folhas, o tronco, a terra, tudo!
Pois sua lavoura perdeu o verde
E com ele a esperança.

É, Vitor, vocês deixaram de herança
Aos nossos filhos e netos
A terra esturricada e árida
Do desamor.

Talvez você nem soubesse
A quem sua voz servia.
Talvez você só quisesse
Nos dar alguma alegria.

É, Vitor, eu diria
Que o sonho do qual você falava
Era apenas utopia.

EmmyLibra 
Dec 28, 2018 - 10:51a.m.


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* Texto adaptado em Fev 5, 2019, a partir de uma importante observação feita pelo meu querido amigo Beto Lacerda, profundo conhecedor da música brasileira, que me chamou atenção para um detalhe crucial: a música à qual respondo no poema tem apenas melodia do Ivan Lins. A letra é do Vitor Martins. Portanto, foi uma "Carta ao Vitor" que eu escrevi, não ao Ivan.
Correção feita!
Gratidão ao Beto pelo esclarecimento, mas sobretudo pela disposição em ler e apreciar meus textos, que não são grandes obras literárias.

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